Pequena Introdução
“Escanção”
era o vocábulo usado para designar o
responsável pelo serviço de vinhos na Corte portuguesa ou casas nobres em
Portugal e ele corresponde ao até aqui designado, “chefe de vinhos” em Portugal
e “sommelier”, no Brasil.
É
a retoma de uma palavra portuguesa, quase posta de parte, em boa hora integrada
ao vocabulário hoteleiro, onde tão necessária se torna a nacionalização.
Por
nos parecer, bem atual, transcrevemos aqui o que dissemos no nosso livro
“Manual de Restaurante e Bar” sobre este profissional. Parece-nos que, pelo
facto de em certos momentos do seu trabalho usar de conhecimentos análogos aos
do barman, será de muito interesse consultar os conselhos que damos a este, na
Postagem “O Bar e o Barman”, sobretudo no que diz respeito, aos cuidados a ter
com o corpo e com o vestuário.
ESCANÇÃO, CHEFE DE VINHOS (SOMMELIER)
Auxiliar
e substituto dos “maitres” ou chefes de mesa, o “escanção” necessita,
para o bom desempenho das suas funções, de todos os conhecimentos do barman e
dos empregados de mesa, aliados a um grande poder de insinuação, necessário a um bom vendedor.
Sabendo-se
que o lucro das refeições é sempre diminuto, é dos vinhos, licores e coquetéis
que se espera obter o necessário rédito para ajudar a manutenção do
estabelecimento.
Uma
vez tomado conhecimento do cardápio escolhido pelo cliente, o escanção deve
dirigir-se a este, sempre como se estivesse tratando com um gourmet,
sugerindo o vinho que, supõe, irá melhor com os pratos selecionados. Se o
cliente o é de facto, apreciará a maneira como o estão servindo; se não o é,
sentir-se-á lisonjeado por ser tomado como tal, sendo o resultado desse sentimento,
na maior parte das vezes, a venda de uma garrafa de vinho que não estava
prevista. Com esse gesto simples, de rotina, serão atingidos dois objetivos de
capital importância para qualquer restaurante: satisfação do cliente e aumento
de receita.
O
escanção deve, pois, estar sempre presente, sugerindo e servindo sem precisar
ser chamado.
O
serviço de vinhos mal feito (copos vazios, vinho servido fora de tempo ou a
temperatura inadequada, etc.) indispõe o cliente pela falta de atenção que
revela, levando a referências pouco lisonjeiras sobre o serviço em geral, do
que muitas vezes os restantes empregados não têm culpa.
Deve
haver da sua parte uma fiscalização constante e uma observância estrita de tudo
o que lhe diz respeito, pois o vinho tem numa refeição um papel muito mais
importante do que simples auxiliar da deglutição.
O
SERVIÇO DE VINHOS
Desde
longo tempo se considerou necessário que uma diferente qualidade de vinho
acompanhasse cada prato, tendo em conta a sua composição. Para isso,
estabeleceu-se a seguinte ordem:
Aperitivo, como - Vinhos generosos, secos ou misturas
(coquetéis).
- Vinhos do Porto, Madeira, Jerez, etc.
Acepipes, com
- Vinhos de mesa brancos, secos,
verdes ou maduros.
Muito
raramente um vinho generoso.
Consommés - Vinho generoso seco.
Sopa - Geralmente não se serve vinho com a sopa, excepção feita para sopas de peixe ou de marisco, que exigem um
branco seco.
Mariscos
ou Peixes:
Cozidos – Vinho de mesa
branco adamado, (doce).
Gratinados ou Assados – Um
vinho verde ou maduro (seco).
Caldeiradas
ou idênticos – Um vinho tinto não muito carregado (verde ou maduro)
Entradas
- Vinhos de mesa tintos ou
palhetes, verdes ou maduros.
Assados ou Caça
- Vinho de mesa tinto (velho se possível). De preferência espumante natural, seco ou bruto.
Queijos
- Vinho de mesa tinto, velho; Porto ou
Madeira.
Doces -
Vinhos espumantes, generosos ou licorosos (meio doce ou doce).
Frutas -
Normalmente, a fruta já tem, por si, acidez que lhe baste para o paladar.
Salvo casos especiais de
frutas como o ananás, morangos, etc., em que um vinho licoroso vai bem, não
acho que se devam servir vinhos com as
frutas. Aliás, estas são já um complemento ou transição para o serviço
seguinte, o dos cafés e licores.
O
vinho espumante (ou o champagne) é o único que se pode servir com todos
os pratos, do início ao fim de uma refeição, excepção feita para o queijo.
Para
este, o vinho tinto, um bom tinto velho, é ainda o ideal, apesar de também se
citarem os licorosos para esse efeito.
Para o vinho do Porto existem cálices especiais, tipo balão, que dão ao
degustador a possibilidade de colher, aliado ao paladar, o aroma do vinho.
(Veja em Vinho do Porto, a descrição do novo Cálice Oficial do Vinho do Porto).
O
vinho sabe melhor quando servido em copos finos. Do mesmo modo, os vinhos
velhos, os vinhos com categoria reconhecida e os de sobremesa, devem ser sempre
servidos na garrafa de origem, tal como estiverem na cave. Para esse efeito,
existem cestos especiais, onde as garrafas são colocadas com cuidado; nada de
movimentos desnecessários, nada de safanões ou golpes. Só em casos muito
especiais, de vinhos com demasiado pé, ou por outra razão forte, se deve
proceder a decantação.
A
mudança dos vinhos, para frascos de cristal, chamados “decanters”, muito
generalizada até há pouco é, um erro, pois faz o vinho perder grande parte de
seu aroma, do seu espírito e da sua qualidade. O verdadeiro sucesso do vinho
está na sua vetustez, não no envólucro que o apresenta.
Para
que os vinhos possam dar ao paladar o prazer desejado por aqueles que os
tratarem desveladamente, deve haver o máximo cuidado na última parte dessa
longa peregrinação iniciada nas dornas.
Nisso,
a temperatura dos vinhos desempenha papel principal. Assim, os vinhos tintos
maduros, os generosos, licorosos e as aguardentes servem-se à temperatura
ambiente. Os vinhos de mesa brancos, rosés, palhetes ou tintos verdes,
servem-se ligeiramente frios. Os vinhos de mesa doces e os espumantes naturais,
servem-se gelados.
O
gelo nunca deve, seja sob que pretexto for, ser adicionado ao vinho; fazemos
evidentemente ressalva, para os casos de preparação de cups, punch ou
misturas similares, para os quais se devem escolher vinhos menos nobres embora
bons.
Vinhos como o Champagne devem ser servidos bem frios, mas essa
temperatura é atingida dentro da garrafa, que se rodeia em caso de emergência,
com uma mistura de gelo e sal. Os vinhos do Reno, o Chablis e o Sauternes,
servem-se levemente frescos, o que lhes dá um paladar agradável. O Clarete e o
Borgonha são vinhos que, pelas suas características, necessitam pelo contrário,
uma temperatura algo mais elevada, sendo de aconselhar servi-los ligeiramente
mornos.
A
maneira mais fácil de levantar um pouco a temperatura dos vinhos é colocá-los
numa estufa, ou envolver as garrafas num pano com água quente.
ABERTURA DE UMA GARRAFA DE
VINHO DE MESA
Para
abrir uma garrafa de vinho, deve-se começar por cortar a cápsula de estanho,
junto à parte inferior da saliência que todas as garrafas têm perto da boca.
Com um guardanapo lavado, limpa-se a sujidade que normalmente se encontra entre
a cápsula e a rolha.
Insere-se
o saca-rolhas na cortiça, bem ao centro. Faz-se com que o saca-rolhas, através
de voltas sucessivas, entre tão fundo quanto seja possível. Procura-se sacar a
rolha de um só golpe, com confiança e elegância. Nada de gestos nervosos nem
sacolejos à garrafa, os quais agitam desnecessariamente o vinho.
No
caso de vinhos velhos, sacolejar é estragar completamente a bebida, pois o pé
assente no fundo mistura-se ao líquido.
Depois
de retirar a rolha, limpa-se bem o gargalo e coloca-se a garrafa na mão com o
rótulo para fora.
Ao
servir, mostra-se o rótulo ao cliente. Nunca se deve enrolar a garrafa em
guardanapos no momento de servir. Noutros tempos, o escanção anunciava, em voz
alta, o vinho que estava servindo. Se isso for julgado necessário, pode ser
feito.
ABERTURA DE UMA GARRAFA DE CHAMPAGNE
Se
a garrafa é apresentada num balde, deve estar na posição vertical, com gelo bem
apertado em toda a volta. É até conveniente cobrir o topo com gelo picado.
Retira-se
a garrafa do gelo e envolve-se num guardanapo, para evitar que escorregue na
mão. É bom ter em conta que a pressão numa garrafa de champagne anda à volta de
8 atmosferas. Quando se retira a garrafa do gelo, o vidro, que é grosso, está
contraído pelo frio. O contacto da mão quente pode, perfeitamente, originar
expansão do vidro no ponto de apoio. Nestas condições, a garrafa pode rebentar.
Ainda
que as possibilidades de isto acontecer sejam remotas, é bom ter conhecimento
destes fatos, para nunca se ser apanhado desprevenido.
Depois
de retirar a cápsula, segurar a garrafa firmemente num ângulo aproximado de 180o
(posição dos ponteiros de um relógio ao marcar 10 horas e 25 minutos) e
desapertar os arames que seguram a rolha. Mantendo o ângulo da garrafa, sacar a
rolha lentamente, tendo o cuidado de a segurar para não atingir qualquer dos
convivas ou colegas de serviço. Depois de sacar a rolha, manter o ângulo da
garrafa por aproximadamente 5 segundos, tempo necessário para que a pressão se
normalize com a do exterior.
Se
a garrafa estiver direita no momento de tirar a rolha, o gás sairá em
turbilhão, arrastando consigo uma boa parte do vinho e, em vez de uma bebida,
teremos conseguido um banho de champagne.
Limpar
a boca da garrafa com um guardanapo limpo. O vinho está pronto para servir.
O
champagne deve ser servido com dois movimentos.
Primeiro,
deitar vinho no copo até que a espuma atinja o bordo deste, sem o deixar
transbordar.
Deixar
a espuma desaparecer e, então, servir a bebida até 2/3 do volume total do copo.
Ter
o cuidado de não servir muito rapidamente, pois nesse caso o vinho transbordará
mesmo.
Vários
cuidados devem ser observados quando se faz o serviço de vinhos.
Daremos
a seguir, uma pequena lista de conselhos ao escanção sommelier , sobre
este serviço:
-
Os vinhos devem
ser trazidos para junto da mesa do cliente, antes de serem necessários, dando a
este a possibilidade de os ver. Os que devem ser servidos gelados, serão
mantidos em baldes com gelo.
O anfitrião
pode provar os vinhos, mas o escanção também pode fazer esse serviço,
retificando se necessário.
-
O serviço de
vinhos deve ser sempre feito com a mão direita e pelo lado direito do conviva.
As senhoras são
sempre servidas primeiro.
-
Para servir
aperitivos ou digestivos, as garrafas devem ser trazidas para a mesa e as
bebidas, servidas à vista do cliente.
-
Os copos de
vinhos, de aperitivos ou de licores, nunca devem ser cheios até ao bordo.
O copo de
vinho só deve ser cheio até metade, para as senhoras, e até 2/3, para os homens.
-
O cesto foi
criado para os vinhos velhos, com o objetivo de manter a garrafa deitada, tal
como sai da garrafeira, para que o pé se não misture ao vinho.
Não adianta
usar o cesto, se não houver antes o cuidado de não agitar a garrafa.
-
Alguns vinhos
velhos com excesso de pé podem ser decantados. O objetivo é retirar o vinho
límpido da garrafa, deixando nesta o sedimento. Vinhos decantados são servidos
em recipientes de cristal.
Não
devem usar-se filtros para decantar vinhos.
Os
vinhos brancos, não precisam ser decantados, pois normalmente não têm sedimento
ou pé.
A
lista ou carta de vinhos é uma grande ajuda para o vendedor. Deve estar
claramente elaborada e ser mantida limpa.
Os
vinhos devem estar inscritos na lista, pela sequência normal do serviço durante
a refeição.
O
vinho deve ser sugerido e a lista apresentada, logo que o cliente acabou de
escolher a comida.
Este
é o momento psicológico para a venda do vinho.
A
lista deve ser apresentada naturalmente, sem grande ostentação, mas com uma
pequena sugestão, se for caso disso.
O
escanção sommelier deve ter o
cuidado de sugerir e servir sempre bons vinhos. Só há um caminho para quem
deseje manter o negócio florescente: servir bom.
Quando
o cliente tem confiança nos que o aconselham, aceita as suas sugestões e, por
norma, um cliente satisfeito é um cliente fiel.
Nunca
se deve decepcioná-lo, servindo-o sempre dentro das suas necessidades, é
assegurar a sua constância e a sua amizade.
Para
atingir essa finalidade, o escanção deve pensar que, na nossa época, o homem
não age só em função das suas necessidades primárias, mas que ao consumo de
determinado produto alia um conjunto de outras necessidades, entre as quais o
conhecimento e a cultura. O bom escanção, como o bom barman, deve saber
conversar e, sobretudo, saber conversar sobre o vinho. Levar ao cliente
interessado algumas bases deste lado do "savoir vivre", é
fazer um adepto e, um amigo.
Para
se poder conversar sobre vinho, deve-se, antes de tudo, saber algo sobre vinho.
Estudá-lo,
prová-lo, conhecê-lo portanto. Ao fazer-se a degustação, devem-se analisar as
várias sensações que o vinho provoca, o que exige uma certa concentração.
O
resultado dessas sensações, deve ser arquivado na memória, para as podermos
analisar e transmitir, no momento em que desejarmos falar sobre vinho.
Por
outro lado, uma conversa exige termos convenientes ou apropriados. Vamos
proporcionar alguns termos que se podem utilizar quando se desejar conversar
sobre vinho:
-
Sobre a
constituição do vinho – (O seu corpo em relação ao paladar).
Se desejamos dizer bem, usaremos termos como:
encorpado, sólido, forte ou vigoroso, de categoria ou de qualidade, acabado (“É
um vinho acabado!”), cheio, leve, substancial, aveludado, macio, delicado,
fino, apetitoso, inteiro, puro.
Para significar que o vinho não é bom, podemos dizer,
de acordo com as circunstâncias: fraco, pobre, frouxo, pouco encorpado, aguado,
pastoso, áspero, acerbo, adstringente, desiquilibrado, pesado, carrascão, travoso,
rascante.
-
Sobre a cor do
vinho
Se desejamos dizer bem: bela, clara, ambarina,
brilhante, sumptuosa, cintilante, rubi ou rubica, purpúrea.
Para dizer mal (se for caso disso): turva, toldada,
murcha, desbotada, carregada.
-
Sobre a
vinosidade (ou teor alcoólico)
Para gabar o vinho, podemos dizer que é: vivo,
nervudo, generoso, forte, capitoso, espirituoso.
Se desejamos demonstrar desagrado, diremos: brando,
fraco, frouxo, frio, vulgar, pastoso.
-
Sobre o conteúdo
de açúcar
Quando satisfaz, diz-se: seco ou doce, suave,
delicado, licoroso, sedoso.
Quando é desagradável, diz-se, buscando o termo
adequado: áspero, pastoso, insípido, adocicado.
-
Sobre o bouquet
ou aroma
Quando este agrada: perfumado, “fruité” (com
sabor a fruto), fino, aromático, oloroso.
Quando não agrada: vulgar, sensaborão, desagradável, “bouchonné”
(sabor a rolha).
-
Quando o vinho
está estragado, diz-se: azedo, avinagrado, voltado, toldado, passado.
Tentámos
resumir os elementos essenciais, permitindo ao profissional desejoso de evoluir,
encontrar o mínimo necessário à sua aprendizagem. Não tivemos a pretensão de
escrever para os mestres.
Esses
encontrarão muitas lacunas neste nosso trabalho. Um manual no entanto, não é um
tratado.
Para
os que se iniciam na profissão, vai toda a nossa simpatia. Já percorremos o
mesmo caminho, estando, portanto, aptos a saber o que lhes será útil, e o que
vai ao encontro dos seus anseios.
Mais
tarde, os seus conhecimentos serão aprofundados através do recurso a outras
fontes. Nessa altura, esperamos que os seus conhecimentos possam ser
transmitidos aos que lhes sucederem, com a mesma boa vontade que nos levou, a
escrever este texto.
E digamos como Bossuet: “Le vin a le pouvoir de
remplir l’âme de toute vérité, de tout savoir et philosophie”.
Traduzindo:
“O vinho tem o poder de encher a alma de toda a verdade, de todo o saber e de
toda a filosofia”.
Esperamos
que assim seja!...
Taças para Ponche ou Bebidas de Reuniões
Os
cestos de vime foram, durante muito tempo, o suporte dos escanções para o
serviço de vinhos velhos. Com o desenvolvimento das tecnologias, outros
auxiliares foram aparecendo e de alguns deles damos abaixo indicação.
Diversos
ALGUMAS PALAVRAS AO SOMMELIER (ESCANÇÃO)
O profissional que decidiu
seguir a carreira de Sommelier, (escanção) deve ter orgulho nela e
deve procurar sempre, em todas as
ocasiões, praticá-la com a maior dignidade.
O vinho é um símbolo místico;
símbolo de alegria; obra tanto da Natureza como do Homem.
Desde a Antiguidade que os cachos,
as folhas e as gavinhas das videiras, fornecem aos decoradores os seus motivos
de ornamento. Encontramo-los a cada passo nos capitéis de monumentos, nos
frontispícios de palácios, em túmulos e em sarcófagos.
Os escultores gregos legaram-nos
várias estátuas de Dionísio (o Baco dos romanos) nas quais a Entidade é
representada sempre como uma figura jovem e bela.
Os
romanos glorificaram Baco e as bacanais.
O vinho identifica-se com o sangue do Senhor,
no mistério da Eucaristia da religião católica.
Ao
analisarmos a arte sacra, verificamos que esta se inspira, naturalmente, na
videira; as iluminuras dos manuscritos da Idade Média, a decoração dos cálices
e os bordados das casulas.
Adão
e Eva tiveram, como primeira vestimenta, uma folha de parreira.
Todas
as obras primas e os seus autores foram, ao longo dos séculos, marcados pela
presença da videira ou do vinho. Nos afrescos romanos, podemos notar gavinhas;
nas naturezas mortas depois da Renascença, quase sempre encontramos um belo
cacho de uvas.
As
cenas de vindima ou de bebedeira, forneceram um assunto vivo e bastante
explorado, aos mestres flamengos e holandeses (Rubens, Brueghel, Jordaëns).
O
grande pintor português José Malhoa, nos seus quadros “Fado” e “Regresso da
Romaria”, mostra-nos que também ali o assunto mereceu interesse.
As
Escolas Francesa, Espanhola e Italiana não o esqueceram. Desta última, quem não
louvará os célebres quadros sobre as bacanais, tanto de Bellini como de
Ticiano. Poderemos ainda citar, além da escultura, pintura, tapeçaria e
bordado, que também a ourivesaria e a cristaleria se interessaram pelo tema,
tendo infalivelmente que chegar à literatura, onde o mesmo transborda.
Escritores
e poetas, cantores e romanceiros de todas as gerações, imortalizaram o vinho;
desde Rabelais, em França, a Omar Khayyâm, o poeta persa, todos misturaram o
vinho com o sonho, o sol e o amor.
Símbolo
místico, fonte de alegria, de galanteria e de opulência, origem de temas que
jamais se esgotam, pois são sempre retomados pelas gerações que se sucedem, o
vinho prova, com a sua perenidade, o desejo de felicidade que o homem sempre
busca.
É
ao Sommelier que compete dar dignidade ao momento em que o vinho é servido.
Deve fazê-lo, sempre, como um “ofertório”, como um ato do mais
alto significado.
Se
concordarmos que o vinho é um símbolo místico, e uma fonte de inspiração, ao
servi-lo, o Sommelier é como um sacerdote, investido de grande dignidade e de
uma grande responsabilidade: o vinho simboliza o Sangue do Senhor.
SABER BEBER
Todo
aquele que serve uma bebida, deve também estar apto a julgá-la. Já fizemos esta
afirmação em relação ao barman. O Sommelier
deve, igualmente, saber beber.
A
Degustação: Ao ato de provar vinho chama-se “degustação”. Esta é a arte que
permite apreciar as várias características de um vinho. Para a executar, devem
entrar em funcionamento três dos nossos principais sentidos: a vista, o olfato
e o paladar.
Pela
Vista - O degustador encontra a cor, a que os
franceses chamam “robe”: Amarelo, leve ou carregado, com variações para
dourado ou vagamente esverdeado, nos vinhos brancos.
Vermelho, leve ou carregado, com variações que vão desde o rubi ao
grená, nos vinhos tintos.
Rosado,
dito em francês “oeil de perdrix”, para os vinhos rosés.
O
vinho deve ser visto à transparência, num copo límpido, sem qualquer cor. O
cristal lapidado evidencia, além da cor, o brilho do vinho.
Pelo
Olfacto – Encontra-se o aroma ou “bouquet” do vinho. Esse aroma pode ser
forte, delicado ou leve. Nos vinhos ricos e carregados, o aroma é espirituoso,
por vezes com fragrâncias que nos fazem lembrar certos frutos ou flores. Para
melhor se aspirar, deve encher-se o copo apenas até ao meio, fazendo-o depois
voltear, levemente, na mão. O vinho passeia-se, então, nas paredes do copo e o
seu perfume desprende-se naturalmente e com toda a intensidade.
Pelo
Paladar – O vinho fala-nos da sua origem. O solo onde foi criado. A natureza
que o procriou. As cepas que lhe deram vida. A idade. O modo como foi
produzido. A língua e o palato, encontrarão tudo quanto o vinho encerra em
álcool, açúcar, gelatina e vida.
A
parte recuada do palato, junto à garganta, transporta ainda algum do seu aroma
à zona onde este também se reflete, e o gosto completa-se.
Os
vinhos têm corpo; certos vinhos são frutosos; uns são macios, outros ásperos;
alguns são aveludados.
Nunca
se deve fumar no momento de degustar um vinho, nem tão pouco aquecer as
garrafas para além do necessário.
OS COPOS (O SERVIÇO DE
VIDROS)
O
primeiro utensílio de que um homem se serviu para beber foi, sem sombra de
dúvida, a palma da mão.
Não
precisaremos de muita imaginação para pensar que assim foi. Ainda hoje, a palma
da mão, em concha, resolve muitas situações análogas.
Com
o decorrer dos tempos, os homens devem ter procurado aumentar, ou sofisticar, a
qualidade dos utensílios destinados a esse fim. As conchas de mariscos, as
cascas de certos frutos, madeira trabalhada em concha, metal, etc, foram,
durante muito tempo, usados para o efeito.
A
descoberta do vidro, apesar de dúvidas existentes, pode ser creditada aos
Assírios ou aos Egípcios. Em qualquer dos casos, remonta à Alta Antiguidade. Os
primeiros copos não eram ainda perfeitos.
Os
exemplares que chegaram aos nossos dias são opacos e irregulares.
Com
o tempo, porém, a indústria vidreira evoluiu, e podemos considerar o vidro como
o material que melhor serve o propósito de beber.
O
prazer da bebida engloba vários sentidos: a vista, o olfato e o paladar. Um
copo transparente, que nos revela as várias tonalidades dos diversos vinhos,
desde o rubi de um Dão, ao límpido dourado de um branco, passando pelo vermelho
brilhante de um clarete, ou o belo rosado de um rosé, permite-nos o prazer da
bebida, antes de começarmos a degustá-la.
Os
copos de vinho são estudados para dar maior satisfação a quem beba o líquido,
tirando o seu prazer tanto do aroma como do paladar. São geralmente compostos
de três partes: o corpo, a haste e o pé.
O
formato de um copo de vinho é muito importante, pois a forma como ele concentra
o sabor e o aroma (ou bouquet), a maneira como enfatiza a característica
do varietal e a forma como dirige o próprio vinho para a melhor área da boca,
tem tudo a ver com o resultado final do prazer de beber um bom vinho.
Para
um bom resultado, a boca do copo não deve ser mais larga que a parte mais larga
do bojo, pois como o oxigénio do ar interage quimicamente com o vinho, o sabor
e o aroma deste são subtilmente alterados. Embora este processo de oxidação
seja mais compatível com vinhos tintos cujo sabor é amaciado quando exposto
para arejar, não é bem aceite pelos vinhos brancos.
A haste,
tão frequentemente relegada pela maioria dos bebedores, tem um papel importante
e deve ser sempre usada para segurar o copo, especialmente ao beber um vinho
branco, pois evita que a temperatura do vinho seja afetada pelo calor da mão
quando se segura o copo.
Normalmente
são usados tipos diferentes de copos com o intuito de acentuar as
características das diferentes variedades de vinhos, pois estes nunca são
iguais. Os vinhos tintos têm tipos particulares próprios, que os produtores
sempre procuram preservar.
O copo do Bordeaux
é projectado para vinhos tintos encorpados e ricos em tanino, como o cabernet e
o merlot. Tem o bojo grande, com uma borda mais fechada para evitar a
dispersão de aromas, concentrando- os. A aba fina direciona o vinho para a ponta
da língua, permitindo que a untuosidade e os sabores frutados dominem, antes
que os taninos sejam direcionados para a parte de trás da boca.
É indicado também para os cabernet sauvignon, cabernet franc,
merlot, syrah e
tannat, entre outras castas.
Os vinhos da Borgonha são complexos e concentrados, produzidos
principalmente com a uva pinot noir. Por
isso o
copo do Borgonha é mais largo que o copo do Bordeaux e tem um bojo maior, formato balão, para concentrar os aromas desses vinhos tintos
e delicados e permitir mais contacto com
o ar deixando que o “bouquet” se libere mais rapidamente. Foi concebido para que o vinho explore
mais o nariz.
O seu formato direcciona o fluxo acima da ponta e do centro da
língua, diminuindo a acidez e acentuando
as qualidades mais arredondadas e maduras do vinho. Além da pinot
noir, é ideal também para que sejam apreciados
vinhos do tipo rioja tradicional, barbera, barricato, amarone e nebbiolo entre outros.
Os
copos de vinho branco variam em tamanho e amoldam o vinho delicadamente no seu
corpo, evitando a oxidação de que falámos atrás. Para preservar um sabor limpo,
muitos copos de vinho branco terão uma boca menor, a qual reduz a taxa de
oxidação. No caso de vinhos espumantes como o champagne ou o asti spumante,
uma boca ainda menor é usada para manter o vinho mais tempo espumoso no copo.
Alguns vinhos brancos como o chardonnay tratado em barris de carvalho,
beneficiam-se quando servidos ligeiramente oxidados, mas é só.
As
flutes de champagne são caracterizadas por uma haste longa com um bojo
alto e estreito. Este formato foi estudado para manter o vinho efervescente por
um largo período de tempo, com todos os efeitos positivos desejáveis durante o
seu consumo. O copo deve ser segurado pela haste, para evitar que o calor da
mão aqueça o champagne. O corpo do copo projetado para ajudar a reter a
efervescência que é a personalidade da bebida, acrescenta também alguma atração
estética, pois permite que as bolhas acrescentem um agradável “charme”
visual.
A ISO (International Standards Organization), unificou uma série
de copos para degustação de vinho. Eles são caracterizados por bojos estreitos
e compridos, com capacidades de 120ml (para Jerez), e 210, 300, ou 410
mililitros conforme a bebida a que se destinam. ISO 3591: