O BAR E O BARMAN
Extrato do meu livro "Manual do Barman e do Escanção"
Se
pretendermos fazer um histórico do serviço de bebidas remontando à Antiguidade,
iremos encontrar como estabelecimento mais conhecido na prestação desse
serviço, a taberna romana (que também existia na Grécia).
Na
citada Ibéria, a designação foi mantida embora com modificação, mas na
Inglaterra, por exemplo, esse nome evoluiu para “pub”, diminuitivo de “public
house” e em França, depois da ocupação russa de Paris, o termo russo bistro
(pronunciado bistrô) foi adoptado também. Bistro em russo
significa “rápido”, palavra que os soldados russos usavam, para pedir que o
serviço fosse imediato, pois tinham receio de ser vistos na taberna pelos seus
superiores. Como os franceses não sabiam russo, passaram a aceitar bistro como
uma nova definição de taberna, e a palavra ficou.
No
período colonial e, mais tarde, no do desbravamento para Oeste, surgiram nos
Estados Unidos, os “saloons”, misto de espectáculo, jogo, bebidas e
prostituição, que perdurou por muitos anos.
Foi
aliás nos Estados Unidos que a imaginação, e a criatividade, mais contribuíram
para a criação de novos tipos de nomenclatura para estes serviços. É deles a
designação de “bar”, tal como é conhecida, a qual analisaremos adiante.
Na
Inglaterra, eram conhecidos os “private clubs” (com serviço de bebidas,
mas comidas também, e acesso interdito a senhoras), onde os homens discutiam os
seus assuntos pessoais, negócios e política.
Os
“clubes privés”, embora o nome possa sugerir alguma ligação, nada têm a
ver com aqueles, pois são apenas e, principalmente, lugares de prostituição.
O
“piano-bar”, o “dancing-bar” e outras definições semelhantes, são
formas de levar as clientelas a se decidirem pelo divertimento e pela bebida.
Nos
hotéis, existe ainda o serviço de “self-bar”, também dito “mini-bar”,
o qual permite ao cliente uma selecção de bebidas em pequenos frigoríficos nos
quartos.
Com
a designação de “snack-bar”, foi desenvolvida na Europa uma modalidade
de serviço que, tomando como base o que nos Estados Unidos se chama “coffee-shop”
e no Brasil, “lanchonete”, evoluiu para um balcão de serviço de comidas e
bebidas, eliminando as mesas.
Analisando
porém a designação que verdadeiramente nos interessa aqui, verificamos que a
palavra bar deriva de “barra” (bar em inglês) e designava,
inicialmente, não o local onde se serviam bebidas, mas sim, o balcão desse
estabelecimento. Era costume esse balcão ter uma barra a todo o seu
comprimento, onde os clientes se seguravam ou encostavam. Essa barra foi
adicionada ao balcão com o intuito de evitar que os clientes se debruçassem
sobre este, mantendo-os de certo modo afastados.
Quando
o cliente queria ir para o balcão, dizia: “vou para a barra”;(”go to the
Bar”). Em Espanha, ainda hoje se utiliza esta forma de identificar o balcão
do bar.
O
tempo e o hábito foram validando esta designação, a qual, por extensão, se
aplica hoje aos estabelecimentos que servem bebidas. Nos Estados Unidos, porém,
é frequente, sobretudo nos hotéis, chamar-se “cocktail-lounge” ao que
entre nós se convencionou chamar “bar” (diminuitivo ou encurtamento de “american
bar”).
Neste
último tipo de estabelecimentos, os hotéis, podemos ainda encontrar outro
género de bar, o “banquet bar”, espécie de copa preparada para o serviço
de bebidas, funcionando anexa ao Salão de Banquetes.
Dali
saem as bebidas para aperitivo, quando há serviço de banquete e todas as
outras, quando se trate de “cocktail parties”.
Instalação
de um Bar
Como para todos os outros
departamentos de indústria hoteleira, não há regras imutáveis para a instalação
de um bar.
Ao fazê-lo, deve-se porém ter em
conta todos os factores que podem influenciar o funcionamento futuro e as
maiores ou menores facilidades que para o serviço possam vir das decisões
tomadas. A eficiência do barman ou dos barmen será sempre influenciada pelas
facilidades que lhes forem concedidas na instalação do seu sector de trabalho.
Um bar trabalha à base de frio.
Logo, um bom balcão frigorífico é necessário. Amplo, com a maior capacidade possível.
Uma máquina de cubos de gelo é também indispensável. Uma boa copa. Armários
para arrumação de copos, garrafas e outros utensílios. Um bar-americano não
deve vender cerveja a copo (na nossa opinião) mas, em certos casos, tal prática
pode ser necessária. Deve ter-se o cuidado de não ocupar lugar dentro do balcão
com todo o equipamento de refrigeração. Além de fazer calor, ocupa espaço que é
necessário para as próprias garrafas. Os compressores podem ser instalados em
qualquer outro lugar. Pessoalmente, somos contra o lava-mãos no balcão do bar.
O lava-mãos, ou lava-louça, pode ser implantado na copa, bem como a máquina de
sumos, a máquina de café, a batedeira eléctrica (se houver) e todos os outros
aparelhos semelhantes.
Se possível, o balcão do bar deve
ter uma entrada e uma saída. Entrada, junto à copa, onde os empregados que
fazem o serviço de mesa podem deixar o material sujo. Saída, junto à máquina
registadora ou PDV (POS).
A máquina registadora deve estar
bem visível. Tal prática coloca o cliente e o barman à vontade. O lucro de um
bar depende da forma como for analisada a sua instalação. Do sentido prático e
económico, tanto do serviço como da decoração, iluminação e implantação. Esta
última deverá se analisada em relação ao local do edifício, se está englobada
numa unidade hotel, ou em relação ao ponto da cidade (se é um estabelecimento
independente). No caso de hotel, será sempre uma boa medida conseguir uma saída
directa para a rua se tal for possível.
Quase sempre um bar representa um
investimento razoável. É imperativo proteger esse investimento mantendo uma boa
qualidade de serviço e de bebidas à altura da decoração e do capital gasto.
Esta última parte é função do barman.
O sucesso de um estabelecimento
deste tipo depende tanto de quem o monta como de quem o orienta.
EQUIPAMENTO
DE UM BAR
A quantidade e a qualidade do
equipamento de um bar, serão determinadas, respectivamente, pelo movimento de
clientela e pela categoria do estabelecimento.
Assim, vamos apenas enumerar as
peças em si, como ajuda à memória dos profissionais:
1o. –
Com que bater coquetéis
Coqueteleira
2o. – Com que mexer coquetéis Copo de cristal
3º. - Algo com que
passar a bebida Passador
4º. – Recipientes
para gelo Balde grande para o balcão
Baldes
pequenos para levar às mesas
5º - Com que
segurar o gelo Pinças de gelo
6º - Com que servir
as bebidas Copos
(falaremos deles mais adiante)
7º - Algo onde pousar os copos na mesa Pequenas rodelas de pano ou papel
(nunca nada metálico).
8º. - Acessórios diversos (para o serviço)
- espremedor de sumos manual.
- facas
de dois ou três tamanhos
- saca-rolhas
e abre-latas
- quebra-gelo
- passador
de sumos
- pá para
absinto
- colheres
para coquetel e long drinks
- bandejas
para apresentar contas
- bandejas
para o serviço
9.º -
cinzeiros para o balcão e para as mesas
10º - saleiros, pimenteiros, moedor de noz
moscada.
11º.- acessórios
pessoais do barman
· isqueiro,
corta unhas, informação detalhada sobre
a cidade, suas ligações aéreas e outras, lista telefónica, jornais diários,
corta- charutos.
E tudo o mais que o barman
entenda necessário, pois não queremos de forma alguma tornar definitivo o que
aqui dizemos.
O BARMAN
O barman perfeito não existe. Se
existisse, teria de reunir uma tão grande quantidade de conhecimentos e
qualidades que nos apetece mencionar aqui o dito gracioso de certo cómico de
Hollywood quando lhe perguntaram como seria a mulher perfeita, o qual afirmou:
“Ela teria que ter as pernas da Marlene Dietrich, o corpo da Marilyn Monroe, o
rosto da Maria Montez com os cabelos da Betty Gable”.
Assim, o barman ideal, deveria
ser um misto de dândi na apresentação; gentleman e diplomata no trato;
bem informado na conversação; psicólogo nos contactos, comerciante avaro ou
esbanjador, sabendo dosear ambas; paciente como um santo e trabalhador como um
judeu, aliando a tudo isto uma vasta cultura.
Não esperamos que o leitor
pretenda candidatar-se a “barman perfeito”, mas aconselhamos que procure reunir
o mais possível dos predicados acima expostos, com a certeza de que, no momento
oportuno, lhe serão úteis.
O trabalho do barman requer
predisposição. O serviço deve ser feito com calma e dignidade, criando uma
atmosfera de bom gosto e em certos casos, de snobismo.
O trabalho do barman requer
atenção e bom repouso. Deve procurar descansar bem e dormir o suficiente. O seu
sorriso é a sua melhor arma e um dos melhores argumentos de venda. Deve cuidar
dos seus dentes e do seu hálito. A sua apresentação torná-lo-á repulsivo ou
atraente para o cliente, que aceitará ou não com prazer, a sua companhia e a
sua conversação.
Deve pois:
-
Pentear-se bem e lavar bem o cabelo. Nada de perfumes
exagerados que sobressaiam num ambiente fechado, como é o do bar.
-
Vestuário impecável, sem manchas de sujidade ou de
transpiração. Roupa interior mudada com frequência.
-
Nunca usar camisas de cor, a menos que façam parte do
uniforme.
-
Não usar jóias, quando em serviço. Apenas a aliança, se
for casado.
-
Ter cuidado com os pés e o calçado. Pés doloridos não
dão um bom sorriso ao barman. Meias mal lavadas não dão bom sorriso ao cliente.
Deve mudar meias e sapatos (se puder), ao menos duas vezes por dia. Sapatos com
muita utilização desenvolvem um cheiro a couro que aumenta com a transpiração.
Esse cheiro passa quando os sapatos arejam. Dois pares de sapatos de serviço
são aconselháveis se o barman transpira dos pés.
-
O barman não deve fumar quando em serviço.
Esta peça deve ser de fácil
limpeza, pois devido à sua função pode sujar-se facilmente. Quanto à cor, o
branco ou o creme são a meu ver a cor ideal. Não há a menor dúvida que o casaco
é ainda o melhor. O barman deve ter dignidade e elegância, por isso, a jaqueta
não é de aconselhar.
O casaco jaquetão parece-nos o
mais indicado. O casaco aberto tem tendência a deixar ver o cinto, a camisa e
por vezes apresenta-nos um barman muito desajeitado. Calças pretas e gravata,
parecem-nos perfeitos. Sapato preto, de verniz, se possível.
O uniforme deve ser usado
impecável. Limpo, engomado e escovado.
O SERVIÇO
DE BAR
O principal serviço num bar é o
da preparação (ou mise-en-place), que geralmente é feito de manhã, antes
da abertura. É esta preparação que vai permitir, pelo dia fora, durante as
horas de movimento, encontrar no seu lugar o necessário, no momento exacto. A
primeira coisa a fazer é, sem dúvida, cumprir o horário. O tempo utilizado
durante a “preparação” jamais é excessivo e, quando esta é feita às pressas
pode comprometer tudo.
A limpeza do bar deve estar
impecável; dentro do balcão, nos frigoríficos e no salão dos clientes. O bom
barman deve fiscalizar os sanitários que servem o “seu” bar, pois serão
utilizados pelos “seus” clientes. A limpeza dos sanitários “diz tudo” sobre a
higiene de um estabelecimento.
A temperatura (ar condicionado ou
aquecimento central), deve ser verificada, bem como inspeccionado o
funcionamento da aparelhagem de controlo. É o conforto que faz vir a clientela
(além das boas bebidas e das atenções do barman).
A carga (quantidade das várias
bebidas) deve ser reposta com requisições feitas à cave ou à despensa. Tudo o
que for entregue à secção deve ser minuciosamente conferido. O bom barman não
deve ter receio do controlo. Deve ele próprio, controlar a sua secção. As
quantidades de gelo existentes devem ser verificadas. Todo o equipamento de
trabalho deve ser bem limpo e inspeccionado.
Os aperitivos de bar devem se
preparados e inspeccionados. Os vulgares salgadinhos, pastelinhos de carne,
bolachas de queijo, etc. devem ser mantidos frescos.
O bom barman deve ter sempre em
mente que, sendo responsável por um departamento de grande impacto social, que
cria, na maior parte das vezes, se não sempre, a imagem do estabelecimento, os
seus modos, gestos e atenções reflectem-se nas vendas e estas, determinam a
política da direcção[1] em relação ao futuro.
Sem pretender torná-las em
“Decálogo” do barman, vamos enumerar as regras que julgamos pertinentes:
Acreditamos que estes dez pontos
são os que mais podem interessar o barman estudioso, com interesse em se
valorizar. A simpática classe dos barmen, por outro lado, deve analisar
osconselhos que a nossa experiência nos sugere como “conselhos aos gerentes” em
relação ao barman.
Conselhos aos Gerentes de Bar
1.
Seleccione bem o barman que pretende admitir.
2.
Entregue-lhe o bar em plena confiança, exigindo-lhe
rendimento e bom trabalho.
3.
Se não tem confiança no seu barman, não o mantenha ao
serviço.
4.
Se quer ter um barman em quem possa confiar, pague-lhe
justo, de acordo com o que lhe é exigido. Um barman que faz bom negócio merece
um bom salário.
5.
Demonstre ao barman que tem interesse por ele e que o
seu serviço lhe agrada. Todos precisam de estímulo para ter bom rendimento.
6.
O controlo do bar não deve ser feito às escondidas. O
barman deve conhecer as bases em que trabalha e o que se espera dele, bem como
as médias a atingir e o tipo de controlo existente.
7.
Ouça as sugestões do seu barman. Ás vezes ele conhece
melhor os clientes que o gerente do bar. E para sermos grandes também temos
que, de vez em quando, ouvir os pequenos.
8.
Não faça regras muito rígidas para o bar. O barman tem
que, por vezes, fazer excepção às regras para satisfazer os clientes.
9.
Se entender que deve treinar os seus próprios barmen,
faça-o. Não se esqueça, porém, que não pode olhar para eles sempre como
aprendizes. No momento em que seleccionar o melhor e lhe der a responsabilidade
de barman-chefe, deve tratá-lo como tal.
10. Procure
estabelecer os seus preços, de acordo com o rendimento que pretende do bar. Não
pode exigir ao barman que seja honesto, se lhe exige rendimento acima do que
lhe é possível dar.
[1] O
hábito de trabalhar em Hotéis leva-me a usar sempre o título de director quando
se trata do responsável por uma unidade mas, como este livro se destina aos
barmen, e eles podem sê-lo também de estabelecimentos independentes, o grau de
gerente ou outro, pode e deve aqui ser aplicado.
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